sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

ReViva - A Grande entrega


Ela veio avisado que chegaria, que cuidaria da minha vida por um tempo, estava resistindo, sem pressa para esse momento, deixando fluir com um pouco de medo e muitos receios.
Afinal, era a Mãe das Mães que vinha banhar minha vida em suas Águas, chegaria as profundezas da minha alma, e o desespero tomava conta, talvez por que me sentisse tão carente da mãe terrena, por me sentir tão abandonada por tantos momentos da minha vida.
Eis que o momento não poderia tardar, foi escolhido cada instante e cada preparo para a grande entrega ... Voltei ao útero, de joelhos ao ventre de Gaia, ali permaneci por longas horas, lutando para viver, lutado para nascer. 
Difícil de respirar, de soltar e entregar, meu corpo úmido e quente, cheio de lama, a lama de que sou feita junto com o sopro do Grande Espírito. No grito de uma criança nasci, renasci e mais uma vez espero o apoio do masculino para me receber.
Banho, alimento, descanso, abraços, dança ... tudo que precisava para chegar a esse mundo.
Achei que havia acabado, mas o processo continuava, como sempre "ela" queria tudo, ela queria mostrar me tudo ... Chorei dizendo: - Não quero ver.
Aos poucos fui sentindo minha calda tomar conta do meu corpo, precisava tirar tudo, e sentir meu quadril em escamas brilhantes e lá em baixo meus pés se uniam em nadadeiras coloridas.
"Ela" me levou para nadar, ahh como amo nadar ... Porém nessa jornada minha vida passava diante dos meus olhos, a emoção tomava conta e meus olhos começaram a transpor tanta água quanto a que eu estava imersa. Cheguei a uma ilha, onde haviam tantas outras sereias, mulheres, crianças, deitaram me na areia, metade do corpo ainda na água, em uma onde de calmaria ... Colocavam flores ao meu redor, desenhavam mandalas a minha volta, muitas flores, frutos, crianças mamando, rindo, sereias na água. Tão sagrado, tão único, tanto amor ...
Desse instante comecei a sentir mais mulheres em volta e entrar em trabalho de parto, o meu parto, via a Grande Mãe Yemanjá me parindo e ao mesmo tempo tinha que parir a mim mesma, a resistência em aceitar, em deixar fluir, fazia tudo parecer doloroso, chorava, urrava por dentro, resistindo a me entregar em águas tão profundas, águas puras ... E ela dizia:
- Amada, você sempre foi minha filha, sempre ... Quando você nasceu fizemos uma acordo, a Mãe dos Ventos cuidaria de ti porque precisaria de uma força guerreira para fazer todos os movimentos que fez, tantas batalhas, muitas dificuldades, mas sempre estive contigo, em cada vela que acendia, em cada prece que entoava e agradeço por suas escolhas, por permanecer leal ao certo, justo e verdadeiro.
Assim, ela cuidaria de sua coroa até seus trinta e três anos e depois você voltaria para mim, para profunda calmaria e amor em sua vida, quando você aceitar, assim será ...
Sua Mãe Iansã, concordou e esteve contigo, na sua jornada até aqui, despesa se dela ...
- Quando precisar de mim, dance e chegarei no sussurro do vento.
Chorava de amor, apego, de desespero e de medo ... Amo a força dos ventos, mas era chegado o momento de me entregar para força das águas.
Nesse instante a vida toda fazia sentido, e ia deixando aquele amor entrar em mim, preencher cada célula e ia me entregando para aquele nascimentos como filha das´profundas Águas ...
A bebê saia dela/mim e uma linda menina meio humana e meio sereia nadava. Ahhhh bendita entrega ... Preciso de vento, preciso de água ... Levanto me e abraço o tambor, o coloco em meu ventre e recebo minha Mãe Yemanjá como Senhora da minha Vida, depois o levo em meu peito e as águas correm de meus olhos infinitamente.
Ela me envolve em seu manto azul e me leva para as profundezas de seu ventre e agora guiará meu caminho. Acendo uma vela, de joelhos a reverencio, ela coroa minha cabeça e fala:
- A partir de agora todo vez que estiver diante de tuas Mães, faça uma reverencia. 
Assim, renasci aos meu trinta e três anos.


ReViva Odoyá Oraieie ô
Juliana Alves T. (Asha)