terça-feira, 18 de dezembro de 2018

Sereia




Recebo o sopro da vida
Logo sou uma gota
Fluo
Seguindo o rio
Até  chegar ao mar
Aberta
Ao  oceano em mim
Sinto sua brisa fria e salgada
Mergulho
Nesse silencio me movo
Com calma e alma
Agradeço
A calda balança
Me faz rir
Brilhante
Cores azul e rosa
Manto infinito
Respiro
Exalo e solto
Cheguei em casa.


Asha
16/12/2018







terça-feira, 6 de novembro de 2018

Beltane e a Era Dourada


Houve um tempo em que a harmonia reinava entre todos os seres, animais, plantas e humanos. Homem e mulheres vivendo como iguais honrando todas as forças e energias. As mulheres portadoras dos mistérios da vida e da morte, carregavam o dom de criar e escondiam esses mistérios dos homens, achavam eles que elas eram mágicas, pois da noite para dia cresciam dentro de si, uma nova vida.
A participação deles nisso era ocultada, então nasceu um complexo de inferioridade, pois não havia como eles se compararem a alguém que magicamente davam frutos como a Terra. Elas detinham esse poder e ocultavam que isso apenas era possível através da semente que eles plantavam dentro delas. Como não partilhavam esses conhecimentos, faziam encontros para partilhar experiências, poções de fertilidade, saudar a natureza e preparar as meninas para sua vida fértil.
Alguns homens começaram a desconfiar e a questionar, a querer saber mais sobre esses “mistérios”. Então, houve uma divisão, parte das mulheres sentiam de partilhar com seus companheiros, de tira lós da ignorância (falta de conhecimento) e entregar o poder que já era deles no dom da criação. A outra parte queria manter secreto, temiam a não compreensão e que eles alterariam o fluxo natural, que as dominariam e manteriam o controle sobre as “sementes”.

Inevitavelmente o equilíbrio foi quebrado, as que sentiram de partilhar com os companheiros o fizeram e as outras partiram e se abrigaram em uma ilha, levaram as meninas, abandonaram seus companheiros e filhos (homens). Após atravessar um rio em meio as brumas, instalaram se em uma montanha antiga, onde apenas mulheres a serviço da Deusa, poderiam pisar. Regras bem claras foram estabelecidas e assim nasceram as sacerdotisas.
Era o paraíso, sem os seres inferiores (homens), elas poderiam viver livremente, cantar, dançar, andar nuas, plantar e colher suas ervas, flores e alimento. Sem olhares desejosos sobre seus corpos, sem nada a esconder, sentindo o sabor da vida, o aroma das flores, o cheiro dos frutos, honrando a Mãe Terra e todas as suas manifestações. Guardavam os antigos segredos da Deusa, entendiam sobre o fluxo da vida, a importância do sangue, curavam suas dores de forma natural e tranquila.
Uma vez que escolheram essa vida, negaram as suas famílias e nunca mais poderiam retornar, seus votos incluíam obediência as condutas, ao sacrifício (sacro ofício) e a ser fertilizada ao menos uma vez em seu ciclo lunar. Como, se não havia homens? Sincronizadas com a fertilidade da Deusa, elas mantiveram o ritual ancestral de fertilidade – Beltane – Do outro lado, a margem do rio, todo ano os homens preparavam fogueiras e um acampamento para esperar as “fadas”, eles nunca sabiam se eram reais ou quem eram, pois nesse dia elas usavam, máscaras, roupas especiais, pinturas, muitas delas reviam seus companheiros, mas não podiam se revelar a eles. Dançavam ao som dos tambores, bebiam vinho, e faziam amor, as sementes estavam sendo plantada.
Antes do amanhecer elas os deixavam, entravam em seus barcos e sumiam nas brumas. Banhavam se, tomavam um chá com ervas para manter a “semente” dentro de si e ficavam deitadas. Em breve estariam gestando como a Deusa, ao nascer os bebês, os que eram meninas ficavam na ilha, os meninos eram abandonados na outra margem do rio, onde regularmente luas após o ritual de Beltane surgiam crianças doadas pelas “fadas”. Ao menos um menino era sacrificado em honra ao deus Sol, seja em forma de aborto espontâneo ou após o nascimento. Vez ou outra também quando não fertilizadas durante o ritual, mulheres caçavam seus reprodutores cantando as margens do rio, eram atraídos por sua beleza, por seus cantos e após o acasalamento eram sacrificados.

A Deusa nunca pediu para que sangue inocente fosse derramado e por isso o desiquilíbrio aumentava. Passou se muito tempo, gerando sofrimentos a filhos sem mães e pais, abandonados, crescendo um desejo inconsciente de conflitos e foi assim que surgiram nossas guerras. Os sem terras ou sem leis, nem sempre foram adotados e cuidados, muitos cresceram na floresta sozinhos ou em grupo e começaram a reivindicar do direito de serem reconhecidos de uma forma nociva, tomando para si o que não tinham.
Dentro dessa balança que pesava muito para um lado, homens subjugados, inferiorizados e oprimidos buscaram fazer o mesmo jogando o peso para o outro lado. O poder feminino foi banido, a conexão com a natureza se perdeu, a mulher de sagrada passou a ser inferior. As antigas histórias foram reinventadas, ouve toda uma alteração na psique inconsciente e isso foi possível pela porta de entrada da culpa.

Do outro lado do rio, uma criança nascia e ela carregava uma profecia, essa profecia dizia que a era da Deusa ficaria adormecida por muitas luas, que o ferro reinaria, uma nova era se iniciava. A Grande Sacerdotisa quis sacrifica ló quando viu o desenho da lua em seu tornozelo, temendo pela era de destruição, guerras, fome e separação. Esqueceu que foi ela quem iniciou a separação, excluindo os homens de seu sagrado, nada mais pode ser feito, durante a noite carregada de amor materno a criança foi levada para outro lado do rio.
E no dia seguinte entregou o pequeno rei para seu destino, a sua chegada ao trono marcou o fim da era da Deusa como a conhecemos e a era do poder masculino agressivo, autoritário e patriarcal chegou trazendo consigo a evolução material da civilização.
As mulheres filhas da Deusa, foram queimadas em fogueiras, foram torturadas, foram dizimadas sem poder manter sua prática e conexão com a natureza. Esconderam sob um manto azul, negaram seus corpos, seu prazer, passaram a temer a figura masculina e a odiar em seu interior. Uma vingança mora em seu inconsciente, essas memórias estão vivas em cada célula do corpo, esperando para serem liberadas.
A era de ferro está findando, e outra há de nascer em breve, a balança será restaurada e ela é dourada, como a Era que se inicia. O assumir as responsabilidades, homens e mulheres, feminino e masculino, liberar as memórias nocivas, ativar as lembranças do tempo que vivíamos em paz e em harmonia com a natureza, animais e plantas, essas memórias também estão dentro de nós.

A guerra cessará, o sangue inocente deixará de banhar a terra, a raiva e o ódio serão lavados com o perdão, o abandono será selado com a união. Sementes serão plantadas com amor, por amor, os frutos serão colhidos de seres despertos, conscientes e em unidade. Deixaremos as ilhas que habitamos dentro de nós para formar um único continente, onde de mãos dadas celebramos, dançamos, cantamos e faremos amor em Beltane.


Asha
02/11/2018




quarta-feira, 15 de agosto de 2018

Quero florir pra mim

Vem primavera
Quero florir pra ti
Para mim
Quero ser a pele
A receber os raios de sol
Exalar o perfume
De mil flores
Respirar o pólen
Sentir o vento
Entre meus cabelos
Tocar meu corpo
Amar minha alma
Vem primavera
Espero por ti
Mais ainda por mim
Preciso voltar
Já sem ar
Nesse profundo mergulho
Quero sentir
Pés na Terra
O bailar de minhas curvas
O sorriso sem pressa

Ah primavera, não se demore, por amor!

Asha





quarta-feira, 11 de julho de 2018

Sinto muito mulheres


Sinto muito mulheres ...

Por terem outras mulheres como inimigas
Que competem
Que brigam ilusoriamente por seus homens
Que dependem e defendem um patriarcado tão cruel
Sinto muito mulheres ...
Por você e suas ancestrais
Que viveram a sombra de um homem
Que não buscaram por si
Não estudaram, se realizaram
Sinto muito mulheres ...
Que cuidaram da casa
E esqueceram de si
Que criaram filhos
E nada mais
E por isso lutam, por ser tudo que tem (são)
Sinto muito mulheres ...
Por sua insegurança
Por falta de empoderamento
De saber quem é
Por humilhar, por implorar
Por se fazer tão pequena
Sinto muito mulheres ...
Sou sua irmã
Sou sua amiga
Posso te ajudar
À você enfim
Se encontrar ...

Asha


sexta-feira, 18 de maio de 2018

A louca que habita em mim


A louca que habita em mim
Vai gritar
Ecoar aos quatro ventos
Que é feita de liberdade
Que não há preço que a compre
Nem conforto e nem casa
Que seu lar é o úmido útero de Gaia
Ela não vai se comportar com uma boa menina
Abre as portas para a menina má
Aquela que não é comportada
Nem submissa
Não é controlável
Aquela que age por amor 
Se sacrifica, se doa
E sabe se resgatar
Voltar para a posse de si mesma
A louca que habita em mim
Vai gritar
Para que tire suas mãos sujas de cima dela
Vai lavar esse olhar lascivo que seu corpo tem dona
Fará ecoar nas montanhas e pela eternidade
A justiça sobre quem a tocar sem consentimento
E um raio descerá sobre a Terra dividindo assim 
Sol e lua
Até tudo se integrar dentro para que um dia manifeste fora 
Ela vai gritar
Ah, se vai ...

Asha







quarta-feira, 9 de maio de 2018

Samhain


Morre!
Dessa vez para sempre
Sem pequenas doses
O que impede a liberdade
Seja real e palpável
Morre, esse gosto amargo do gozo fatigado
Da obrigação de tocar
Do silêncio ao vazio a exalar
Na frieza de deitar, sem coração
E cobrir se de palhas finas e algodão 
Morre as raízes 
Seca nesse deserto do não sentir
E jamais se permitir
De se estar ao lado
Quando o corpo está fechado
Morre na ausência 
Da fúnebre presença
Esse telhado já não me traz melancolia
Pois debaixo da Terra
Vejo apenas estrelas
Escorrego pelas grades 
E fluo na tempestade.

Asha
01/05 à 09/05/2018










quinta-feira, 8 de março de 2018

Mulher

Hoje saúdo minha linhagem feminina
Hoje parabenizo minha mãe, avó e filha
Hoje lembro uma vez mais o dom de gerar e manter a vida
Hoje lembro me de amar me cada vez mais 
E dar me o que é preciso
Hoje manifesto a flor que sou
Exalo o meu perfume por onde passo
Mantenho a pureza da Menina
A sensualidade da Mulher
O amor da Mãe
E a sabedoria da Anciã
Hoje honro a presente sagrada benção de ser Mulher.


P.S: Dedicada à todas as mulheres em suas múltiplas fases e faces.


Asha



sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

ReViva - A Grande entrega


Ela veio avisado que chegaria, que cuidaria da minha vida por um tempo, estava resistindo, sem pressa para esse momento, deixando fluir com um pouco de medo e muitos receios.
Afinal, era a Mãe das Mães que vinha banhar minha vida em suas Águas, chegaria as profundezas da minha alma, e o desespero tomava conta, talvez por que me sentisse tão carente da mãe terrena, por me sentir tão abandonada por tantos momentos da minha vida.
Eis que o momento não poderia tardar, foi escolhido cada instante e cada preparo para a grande entrega ... Voltei ao útero, de joelhos ao ventre de Gaia, ali permaneci por longas horas, lutando para viver, lutado para nascer. 
Difícil de respirar, de soltar e entregar, meu corpo úmido e quente, cheio de lama, a lama de que sou feita junto com o sopro do Grande Espírito. No grito de uma criança nasci, renasci e mais uma vez espero o apoio do masculino para me receber.
Banho, alimento, descanso, abraços, dança ... tudo que precisava para chegar a esse mundo.
Achei que havia acabado, mas o processo continuava, como sempre "ela" queria tudo, ela queria mostrar me tudo ... Chorei dizendo: - Não quero ver.
Aos poucos fui sentindo minha calda tomar conta do meu corpo, precisava tirar tudo, e sentir meu quadril em escamas brilhantes e lá em baixo meus pés se uniam em nadadeiras coloridas.
"Ela" me levou para nadar, ahh como amo nadar ... Porém nessa jornada minha vida passava diante dos meus olhos, a emoção tomava conta e meus olhos começaram a transpor tanta água quanto a que eu estava imersa. Cheguei a uma ilha, onde haviam tantas outras sereias, mulheres, crianças, deitaram me na areia, metade do corpo ainda na água, em uma onde de calmaria ... Colocavam flores ao meu redor, desenhavam mandalas a minha volta, muitas flores, frutos, crianças mamando, rindo, sereias na água. Tão sagrado, tão único, tanto amor ...
Desse instante comecei a sentir mais mulheres em volta e entrar em trabalho de parto, o meu parto, via a Grande Mãe Yemanjá me parindo e ao mesmo tempo tinha que parir a mim mesma, a resistência em aceitar, em deixar fluir, fazia tudo parecer doloroso, chorava, urrava por dentro, resistindo a me entregar em águas tão profundas, águas puras ... E ela dizia:
- Amada, você sempre foi minha filha, sempre ... Quando você nasceu fizemos uma acordo, a Mãe dos Ventos cuidaria de ti porque precisaria de uma força guerreira para fazer todos os movimentos que fez, tantas batalhas, muitas dificuldades, mas sempre estive contigo, em cada vela que acendia, em cada prece que entoava e agradeço por suas escolhas, por permanecer leal ao certo, justo e verdadeiro.
Assim, ela cuidaria de sua coroa até seus trinta e três anos e depois você voltaria para mim, para profunda calmaria e amor em sua vida, quando você aceitar, assim será ...
Sua Mãe Iansã, concordou e esteve contigo, na sua jornada até aqui, despesa se dela ...
- Quando precisar de mim, dance e chegarei no sussurro do vento.
Chorava de amor, apego, de desespero e de medo ... Amo a força dos ventos, mas era chegado o momento de me entregar para força das águas.
Nesse instante a vida toda fazia sentido, e ia deixando aquele amor entrar em mim, preencher cada célula e ia me entregando para aquele nascimentos como filha das´profundas Águas ...
A bebê saia dela/mim e uma linda menina meio humana e meio sereia nadava. Ahhhh bendita entrega ... Preciso de vento, preciso de água ... Levanto me e abraço o tambor, o coloco em meu ventre e recebo minha Mãe Yemanjá como Senhora da minha Vida, depois o levo em meu peito e as águas correm de meus olhos infinitamente.
Ela me envolve em seu manto azul e me leva para as profundezas de seu ventre e agora guiará meu caminho. Acendo uma vela, de joelhos a reverencio, ela coroa minha cabeça e fala:
- A partir de agora todo vez que estiver diante de tuas Mães, faça uma reverencia. 
Assim, renasci aos meu trinta e três anos.


ReViva Odoyá Oraieie ô
Juliana Alves T. (Asha)