segunda-feira, 5 de setembro de 2016

O último mergulho



Lembro me nitidamente da última noite em que fui convidada a descer as profundezas, não foi um rapto súbito e nem amedrontador ... Ahh foi tão sutil, belo e delicado.
Um abraço carinhoso e aconchegante, um olhar que enxergava a alma, e uma pergunta:
- Está feliz? - Sim, muito! Um leve toque nos lábios, um até logo, e assim fui jogada em uma jornada tão desafiadora quanto o enfrentar da própria sombra.
A cada passo que descia, lírios brancos iam sendo deixados pelo caminho, o perfume me faria voltar, lembraria do cheiro da manhã, do sol, do calor e do respirar de um retorno.
Por ter o olhar sempre elevado, nem percebia a profundidade que estava descendo, somente quando estava lá, me deparei com tantas batalhas e ruínas, com seres de todas as espécies, com suas prisões reais e ilusórias, precisando de orientação, de luz e de esperança.
Tão difícil de respirar, tão dolorido de sentir, que guardei meu coração em uma concha e aos poucos a beleza de tudo ia ficando preto e branco, um cinza tão adequado.
Por mais fundo que fosse, o anjo orientador seguia me e dizia que era preciso ficar sozinha, em silêncio, aguentar, que passaria no momento certo.
Fui despindo me de tudo, das pessoas, das roupas, dos cabelos, dos desejos, dos prazeres, do ego, apenas fazendo o que era preciso.
Ao final da escada, um salão e boas vindas, como se fosse um troféu e novas armas para as próximas batalhas, conhecimento, autoconhecimento, faces sombrias que guardam toda força para voltar.
Antes, um último mergulho, meus desejos em um bandeja ... Já estou tanto tempo aqui embaixo que quase não recordo como é lá em cima, saudades do sorriso por nada, do reflexo no lago, dos banhos de cachoeira, e do abraço "dele".
Está na hora de voltar! Me despeço em gratidão por todas as experiências vividas, por todas as curas recebidas, por todos os seres resgatados e libertos ...
Respiro fundo, busco as forças que ainda restam e lentamente cada degrau vou subindo, seguindo o cheiro dos lírios e a luz do Sol.
O gosto de romã em meu lábios, me faz lembrar que voltarei, mas agora, vou subir, na mesma profundidade que desci e aproveitar o frescor da Primavera.

Asha
quase primavera












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